29/04/13

Greve de fome, prisão sem fim


O QUE ESTÁ A CONTECER EN GUANTÁNAMO

26/04/2013
Há 11 anos os primeiros prisioneiros chegavam a Guantánamo, em Cuba. O governo Obama prometeu fechar a prisão mas não cumpriu. 84 presos estão em greve de fome depois que guardas revistaram exemplares do Alcorão durante uma inspeção em fevereiro — mas a greve tornou-se algo bem maior do que um protesto contra o desrespeito ao livro sagrado.
 A greve de fome começou depois que guardas revistaram exemplares do Alcorão durante uma inspeção nas celas em fevereiro — mas tornou-se algo bem maior do que um protesto contra o desrespeito ao livro sagrado.
Os militares americanos dizem que os presos tinham escondido “armas improvisadas, comida e remédios não-autorizados” na lombada de exemplares do Alcorão, e que a revista foi feita de acordo com o padrão, por tradutores muçulmanos.
Já os advogados afirmam que os presos propuseram deitar fora os livros, em vez de tê-los revistados dessa maneira. Os militares inicialmente não aceitaram essa opção, mas agora dizem que os prisioneiros podem optar por não ter o Alcorão.
Outras revistas a exemplares do Alcorão já tinham gerado greves de fome em 2005.
Desta vez, todos – desde a Cruz Vermelha até o comandante do Comando-Sul do Pentágono americano – concordam que a greve foi causada pela crescente frustração e desespero dos presos.
Há poucas indicações de que Guantánamo será fechada ou que os pesos serão transferidos para outro lugar num futuro próximo. O último a deixar a prisão, no ano passado, só saiu de lá morto.
O general John Kelly, chefe do Comando Sul americano, disse no mês passado que os presos haviam ouvido o discurso de Obama e perceberam que não havia nenhuma menção a eles. “Isso causou frustração e eles querem aumentar a temperatura, voltar aos média” diz Kelly.
Num relato publicado no New York Times, Samir Moqbel, um preso do Iémene em greve de fome, afirmou esperar que “por causa do nosso sofrimento, os olhos do mundo vão novamente voltar-se para Guantánamo antes que seja tarde.” Outro preso, o saudita Shaker Aamer, também escreveu um artigo, dizendo que esta greve de fome é diferente das anteriores que já fez. Segundo os advogados, a greve de fome foi adotada por muito mais presos do que os militares admitem. Nesta segunda-feira, o número de grevistas chegou a metade do total – 84 – segundo os militares.
De acordo com os militares, dois presos tentaram cometer suicídio desde o início da greve de fome.
Houve conflitos entre os guardas e os presos?
Sim. Na manhã de 13 de abril, soldados com equipamentos anti-motim transferiram 60 presos da cela de convivência conjunta para celas individuais. Os guardas atiraram balas não-letais; eles afirmam que os prisioneiros tinham armas improvisadas, como garrafas de plástico cheias de pedras e cabos de vassoura.

Comandantes militares afirmaram ao Miami Herald que os presos estavam a ignorar as suas ordens, cobrindo as câmaras de monitoramento, tocando nos guardas através das grades, atirando urina nos militares e recusando-se a trancar-se nas celas para inspeções durante a noite.
Em janeiro houve outro conflito no campo de futebol da prisão no qual os guardas também dispararam balas “não-letais” sobre os presos.
Num comunicado essa semana, os militares afirmaram que os presos passaram a ser monitorados 24 horas por dia. Em anos recentes, a cela comum foi transformada em dormitório. Agora, segundo o jornal Miami Herald, os presos estão de novo mantidos em celas individuais, sem TV e sem os seus documentos pessoais.
Os advogados afirmam que os guardas se tornaram mais duros nos últimos meses, confiscando cartas e objetos pessoais.
Omar Farah, do Centro de Direitos Constitucionais, diz que ele e outros advogados temem que a transferência para celas individuais os impeça de saber o que está a acontecer com a greve de fome. “Temos obtido informações principalmente através do relato de outros presos.”
Os presos em greve de fome estão sendo punidos?
Pelo menos um prisioneiro afirmou que os grevistas estão a ser punidos ao serem forçados a tomar água da torneira, além de manterem temperaturas baixas nas suas celas. Os militares americanos negam.
Mas e a alimentação forçada?
Até meados de abril, 15 presos estavam a ser alimentados à força com suplementos nutricionais através de tubos enfiados nariz abaixo. Os militares alegam que os presos apresentam-se voluntariamente para essas sessões. Porém, para eles, os presos que desmaiam estariam a dar o seu consentimento.
Outros presos são amarrados durante o procedimento. Moqbel escreveu no New York Times que em março chegou a passar 26 horas amarrado. “Duas vezes por dia, amarram-me a uma cadeira na minha cela. Os meus braços, as minhas pernas e a cabeça são amarrados. Nunca sei a que horas vão chegar”, relatou.
A Cruz Vermelha e outros grupos de direitos humanos são contra a alimentação forçada; afirmam que os prisioneiros têm o direito de escolher se querem comer. Já os militares americanos defendem que seria desumano deixar os prisioneiros morrer de fome.

Quantos prisioneiros ainda estão em Guantánamo?
166. Desde 2002, 779 pessoas passaram pela prisão.
Nenhum novo preso foi trazido pela administração Obama, e os penúltimos a sair foram dois muçulmanos chineses, transferidos para El Salvador no ano passado. Adnan Latif, um iemenita, suicidou-se em setembro. Foi o nono preso a morrer na prisão.
Os EUA consideram os prisioneiros terroristas perigosos?
Não. Na verdade, cerca de metade dos presos atualmente em Guantánamo teve a libertação aprovada. Veja como está a situação legal dos presos:
56 receberam permissão para serem devolvidos aos seus países ou transferidos para outros. Aqui estão os nomes.
30 iemenitas também foram libertados mas continuam na prisão por causa da situação de insegurança no país, segundo os EUA.
24 pessoas ainda “podem ser julgadas”.
46 estão a ser mantidos indefinidamente presos por serem considerados “muito perigosos para serem soltos”, mas não estão a ser devidamente julgados.
Sete estão a ser julgados por comissões militares, entre eles cinco acusados de organizar os ataques de 11 de setembro.
Três foram condenados por comissões militares e estão cumprindo a sentença. Outros quatro foram condenados e depois transferidos para os seus países.
Os EUA não publicaram os nomes dos presos em greve de fome, mas sabe-se que alguns estão na lista dos que já foram libertados mas continuam presos.
Por que os presos libertados ainda não foram soltos?
Nos últimos anos o Congresso dos EUA proibiu a transferência de prisioneiros para o país, e tornou mais difícil a sua transferência para outro países ao exigir a garantia de que o indivíduo não representasse uma ameaça futura.
Isso tornou a transferência difícil, mas não impossível, já que a legislação prevê maneiras de contornar as restrições. Grupos de direitos humanos estão a pressionar Obama, sem sucesso.
Desde que a lei entrou em vigor, quatro presos foram enviados para o exterior, mas em todos os casos as transferências foram ordenadas pela Justiça ou resultado de um acordo com a comissão militar – o que é permitido pelo Congresso americano.
Quanto aos iemenitas presos, Obama anunciou a suspensão das transferências para o Iémene depois de um atentado fracassado no Natal de 2009. Há também temor de reincidência – segundo um relatório do Diretor de Inteligência Nacional, cerca de 16% dos presos libertados tinham voltado a atividades de militância.
Mesmo assim, o presidente do Iémene, que tem trabalhado proximamente com os EUA em contra-terrorismo – inclusive numa campanha com drones dentro o território do país – recentemente referiu-se a Gauntánamo como uma “tirania”.
O Reino Unido também fez lóbi pela libertação de um preso em greve de fome, Shaker Aamer, que tem residência no país. O Comissário para Direitos Humanos da ONU afirmou que a detenção por tempo indefinido em Guantánamo “é uma clara violação da legislação internacional”.
Por que Obama ainda não fechou Guantánamo?
A Casa Branca diz que “permanece comprometida” a fechar Guantánamo, mas os seus planos foram paralisados pela oposição do Congresso.
Um dos primeiros atos de Obama quando se tornou presidente foi uma ordem executiva para desativar a prisão no prazo de um ano. Não descartou a detenção militar contínua ou o julgamento em comissões militares, mas suspendeu temporariamente as comissões e exigiu uma revisão da situação dos presos. Num discurso poucos meses depois, Obama disse que “a existência de Guantánamo provavelmente criou mais terroristas ao redor do mundo do que jamais deteve” e provocou “um retrocesso na autoridade moral que é a moeda mais forte dos EUA no mundo”.
A partir daí, o Congresso aprovou restrições – e a administração abandonou muitos dos seus esforços para fechar Guantánamo.
Em janeiro, o Departamento de Estado desativou o escritório responsável por realocar os presos. Mesmo que as restrições de transferência fossem flexibilizadas, ainda não é claro o que aconteceria com os prisioneiros que estão detidos por tempo indefinido. Uma nova revisão periódica dos processos dos detidos foi criada em 2011, mas ainda não começou de facto.
O que os observadores internacionais podem saber sobre Guantánamo?
Não muito além daquilo que os militares querem. As reclamações sobre a qualidade da água, o número de grevistas e as revistas no Alcorão ressaltam as limitadas – e por vezes unilaterais – informações que saem da prisão.
Os detidos comunicam-se principalmente através dos seus advogados. Os militares controlam o acesso à prisão. Recentemente, repórteres foram expulsos da prisão por algumas semanas.
Há pouco tempo, um fotógrafo da Reuters relatou como foi a sua visita, extremamente monitorada, incluindo restrições do que se podia ou não fotografar. Carol Rosenberg, do Miami Herald, também descreveu recentemente as restrições a repórteres que cobrem Guantánamo, como ela faz há 11 anos. Por exemplo, nunca obteve permissão para conversar com um detido.
A Cruz Vermelha tem acesso aos prisioneiros e está em Guantánamo desde o início da greve, mas as suas descobertas raramente são publicadas. Na semana passada, o presidente do grupo classificou a situação dos prisioneiros como “insustentável”.
Por Cora Currier, do ProPublica, reproduzido da Pública
extraido da web de esculca,

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